O responsável pelas "Florinhas do Vouga", padre João Gonçalves, disse hoje haver "falta de coragem" para resolver o drama dos ocupantes da antiga EPA, onde se registou a morte de mais um imigrante de leste. O edifício abandonado, à entrada da cidade, que foi sede à Empresa de Pesca de Aveiro (EPA), tem servido de refúgio a várias pessoas sem abrigo, designadamente imigrantes de leste, em condições degradantes. Em Janeiro apareceu ali morta uma mulher de 34 anos, toxicodependente, e ontem foi encontrado sem vida um imigrante ucraniano, de 55 anos, que frequentava a "cozinha social" das Florinhas do Vouga. Além da alimentação que fornece aos moradores da antiga EPA, através da cozinha social, as Florinhas do Vouga têm contactado os que ali pernoitam através de uma equipa de exterior, mas o seu responsável reconhece um sentimento de impotência perante o drama dos que ali vivem. "Não temos alternativas para lhes oferecer, porque o projecto que temos para construir uma casa de acolhimento aos sem abrigo, apesar da boa pontuação, não obteve financiamento, com a justificação de não haver verbas", comentou. O padre João Gonçalves coloca em causa os levantamentos oficiais que são feitos sobre o número de pessoas sem abrigo na cidade, concluindo que servem para "esconder debaixo do tapete" a real dimensão desse problema social. "Não são considerados os 'sem abrigo' que ocupam casas abandonadas, mas apenas os que dormem na rua, pelo que não ficam enquadrados nas prováveis respostas dos sistemas oficiais e ficam entregues à sua sorte. Claro que assim são menos, reduzindo a pressão para que haja uma resposta dos poderes públicos a esse drama", comenta. O edifício degradado pertence à Direcção-Geral do Património do Ministério das Finanças que tenciona aliená-lo, mas reclama uma indemnização pelos prejuízos de uma eventual demolição. Em causa está a redução da área de construção naquele terreno, por força do plano de urbanização previsto pelo Programa Polis para a zona e do Plano Director Municipal. O direito à indemnização não é reconhecido pela Câmara de Aveiro, que alega ser o actual edifício anterior aos instrumentos de planeamento aprovados e que pretende ver aquela construção demolida. Para o padre João Gonçalves, não é por se demolir o edifício que se resolve o problema e essa "solução" corresponde a "uma atitude de pouca verdade" perante os dramas humanos que a antiga sede da EPA esconde e "apenas torna a cidade mais airosa e bonita". "Esquecem-se que há lá pessoas e não se pensa nas suas vidas. O que falta é coragem da parte de toda a gente que tem em mãos o problema dos "sem abrigo" para resolver a situação", disse à Lusa o padre João Gonçalves. |