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16-01-2006

Paguei sempre as facturas que me apresentaram


Consultório jurídico - a EDP pode cobrar dívidas do ano de 2002?

Esta rubrica está aberta a todos quantos queiram ver esclarecidos problemas e dúvidas. Para haver resposta bastará para que o leitor envie carta expondo a questão que gostaria de ver esclarecida, para o endereço electrónico, jb@jb.pt ou

Consultório Jurídico do Jornal da Bairrada
Apartado 121
3770-909 Oliveira do Bairro



Jornal da Bairrada reserva-se, no entanto, o direito de seleccionar as perguntas recebidas de acordo com os seus critérios de relevância, interesse e oportunidade, e de editar o seu conteúdo, respeitando escrupulosamente as ideias transmitidas pelos nossos leitores.

Refira-se que não são consideradas perguntas que contenham acusações ou onde sejam emitidas suspeitas relativamente a pessoas ou entidades identificáveis.

Este Consultório Jurídico visa informar os leitores sobre os seus direitos dos cidadãos, o Direito e a organização e o funcionamento da Justiça, mas não pode, como se compreende, pela sua natureza, constituir um aconselhamento jurídico. Não pode ser considerado em caso algum um substituto de uma consulta a um advogado.

O consultório jurídico, publicará, semanalmente, uma resposta, no entanto, caso o número de pedidos exceda as expectativas, poderemos, eventualmente, alargar o número de respostas.

Pergunta:

Gostaria de saber se a EDP pode cobrar dívidas do ano de 2002. É que a EDP está agora a cobrar-me facturação desse ano, o que acho estranho, porque paguei sempre as facturas que me apresentaram. Para mais, quando em contacto com a empresa, os seus responsáveis dizem-me que tenho que pagar, caso contrário procederão à suspensão ou mesmo ao corte de fornecimento. Como devo proceder e que direitos me assistem?



Paulo Costa*

Resposta:

Sobre esta questão, que actualmente tem sido muito suscitada, a Lei que o consumidor tem à sua disposição, não podia ser mais clara: na realidade, o artigo 10º, nº 1 da Lei dos Serviços Públicos Essenciais (Lei nº 23/96 de 26 de Julho), diz taxativamente: “O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”. Neste diploma legal encontram-se abrangidas as dívidas resultantes dos serviços de fornecimento de água, energia eléctrica e gás.

A dívida pelo fornecimento de energia eléctrica prescreve, pois, seis meses após a prestação do respectivo serviço, entendendo-se, como tal, o final do mês, ou seja, a data em que a factura é regularmente emitida, sendo o final do mês, a regra usual. Só não prescreve, no prazo de seis meses, a dívida por fornecimentos em alta e muito alta tensão, o que não é o caso dos consumidores domésticos enquanto tal, que são servidos regra - geral por redes de baixa tensão.

Tem havido “entendimentos” nada fidedignos que apontam para que o aludido prazo de seis meses seria para a emissão da factura, que, só após a sua emissão, é que o prazo contaria e que enquanto o fornecimento se mantivesse não prescreveria a dívida por se tratar de uma prestação contínua.

Estas “interpretações” da Lei são erradas, nada sendo condizentes com o espírito da Lei nº 23/96 e, portanto, não devem merecer, como não merecem, a tutela do direito. Logo, se, naquele lapso, de tempo (seis meses), não for efectuada a cobrança ou adoptado qualquer comportamento que equivalha à suspensão ou à interrupção da prescrição, a dívida prescreve.

No entanto, para que a prescrição opere é necessário que o consumidor a invoque, judicial ou extrajudicialmente. Judicialmente, caso tenha sido movida acção contra si, na contestação em que apresente defesa, terá que ser invocada para que dela possa beneficiar. Se não for invocada, a prescrição não opera, pois não é de conhecimento oficioso pelo Tribunal e o consumidor será condenado a pagar os montantes respectivos. Extrajudicialmente, por carta para a empresa que exigir o cumprimento da dívida prescrita.

Logo, no presente caso, a EDP, embora possa tentar cobrar dívidas respeitantes ao ano de 2002, não pode exigir o seu efectivo pagamento, se o consumidor invocar a prescrição, que não há dúvidas, ocorre seis meses após a prestação do serviço. Posição que a EDP, depois de tanta luta, parece agora aceitar, mas que se afigura não estar a ser uniformemente observada em todos os pontos de contacto com o consumidor, uma vez que os consumidores finais são muitas vezes confrontados com o aviso de suspensão e mesmo corte do fornecimento.

Este tipo de actuação por parte da EDP levou já, em Julho de 2005, o Instituto do Consumido, a emitir uma Recomendação à referida empresa em virtude da crescente conflitualidade com os consumidores. Nessa Recomendação exigia-se a tomada de medidas por parte da EDP no sentido da “adopção de medidas necessárias para garantir que o mecanismo de facturação se adeque às regras sobre prescrição e caducidade, fixadas na Lei nº 23/96 de 26 de Julho, devendo processar-se e conformar-se com essas regras”.

Em suma, o consumidor, confrontado com a cobrança de dívidas sobre prestações de serviços de distribuição de energia eléctrica há mais de seis meses, deve desobedecer e não pagar, invocando veementemente a prescrição das mesmas.

*Advogado


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