Talvez fosse altura para escrever sobre as presidenciais, mas acho que o assunto de momento é o orçamento do Estado para 2006. Os presidenciáveis mais ou menos importantes, os que ainda poderão aparecer e os que vão desistir, mesmo que afiancem o contrário, podem esperar. Os portugueses nunca se ligaram muito aos orçamentos do Estado, mas, o pior é que os governos também nunca os seguiram muito à regra. Se assim não tivesse sido, não tinham que andar, nos últimos ano, ou décadas, a maquilhar as receitas e as despesas para ficarem bem na fotografia do instante orçamental, mas borrarem, a tinta negra, o futuro da Nação com a sua implementação. Se olharmos para os orçamentos de algumas Câmaras Municipais (um dos melhores exemplos é a da capital do distrito) percebem bem que se inventava receita que nunca seria cobrada para se prosseguir obra bonita, mas talvez não muito produtiva, sobreendividando a autarquia para muitos anos. O Estado Português tem feito o mesmo. Gasta no que não interessa nada, contrata montanhas de funcionários públicos para sectores onde já estão excedentes e teima em deixar sectores vitais com falta deles, constrói e reconstrói a linha do norte várias vezes e, posteriormente, ainda precisa de um TGV para andar 30 km mais rápido entre Lisboa e Porto. No entretanto vai-se convenientemente esquecendo de construir o acesso ferroviário ao Porto de Aveiro, que tão necessário é para as regiões da Bairrada e limítrofes. Talvez não se endivide na mesma proporção que as câmaras municipais, mas aumentam, sistematicamente, a despesa corrente para níveis insuportáveis de manter. Este governo claro que tem que pedir sacrifícios aos portugueses. Isso já todos sabemos e fazemos nas nossas casas porque simplesmente não é possível continuar a gastar o que não temos. E esta conversa começa a ser recorrente, mas não saímos da crise. E porquê? Porque a crise já não é uma crise qualquer. Já não apenas uma crise de dinheiro ou falta dele, de melhores ou piores funcionários, de mais obra de betão armado ou pior assistência social. Esta crise já não se resolve ou adia com qualquer orçamento porque ela, é no essencial, uma crise de valores e de ética. Desde logo naquilo que se estuda enquanto oposição e no que se promete em campanha eleitoral. Os pontos de contacto entre a campanha eleitoral e a governação cada vez mais parecem a mistura do azeite com a água. Foi assim com Durão Barroso e Santana Lopes. Parece ser o caminho que Sócrates está a trilhar. Pensa-se muito na imagem e em ficar bem na fotografia e pouco na resolução dos problemas profundos. No caso vertente, e apenas porque é o mais próximo da nossa memória (os portugueses e os outros povos costumam ter memória curta) prometeram-se as scuts de borla, afiançou-se não mexer nos impostos, impôs-se reduzir drasticamente a despesa pública etc. Já todos percebemos que muitas destas promessas vão cair ao mesmo tempo que o Estado continua a adiar a dissolução de institutos ineficazes e muito pouco produtivos como o IDP. É por isso que os orçamentos valem o que valem ou seja, para muitos valem o mesmo que as promessas de campanha eleitoral quando, por exemplo, mais uma vez se adiou a solução da Pateira de Fermentelos em sede de PIDAC, a construção do Tribunal e Centro de Saúde de Oliveira do Bairro, bem como o Centro de Acolhimento de Crianças em Risco de Sangalhos, o Centro de Apoio Social de Vila Nova de Monsarros e Lar Nossa Senhora da Piedade, na Poutena.
António Granjeia* *Administrador do Jornal da Bairrada |