1. É impossível esconder os olhos da realidade. A “Aldeia Global” em que está hoje transformada o mundo cria imperativos de proximidade, para todos, até para os sistemas mais conservadores. Assim, a abertura à realidade do mundo desafia a uma reinterpretação da “parte” ao serviço do “todo”. Isto aplica-se aos sistemas sócio-políticos, às grandes religiões da humanidade, a toda a investigação desenvolvida nas maiores universidades do mundo, à própria nova consistência estrutural e papel da ONU (a haver) e das instâncias humanitárias universais. O saber-se que, “de três em três segundos”, morre uma criança com fome, entre os tantos habituais relatórios deste género que vêm perturbar a nossa comodidade de termos o privilégio das três refeições diárias, porventura esbanjando preciosidades de alimentação que seriam tesouro noutras terras famintas, toda esta realidade vai assim, cada vez mais, entrando pelos “olhos dentro” de todo o “cidadão global”. Sinal dos tempos da comunicação que, mostrando alguma da verdade que vai por esse mundo fora, cria uma inquietude de mover todas as montanhas para tornar possível um mundo diferente. Cada vez mais, quem quer criar uma utilidade definitiva e última para a sua vida, deixando marcas na sofrida história que se escreve dia-a-dia e fim de a aliviar das suas dores, em cada trabalho, em cada gesto uma certa “reciclagem da esperança” será luz fundamental. Os líderes da humanidade que apreciamos, ao longo dos séculos, foram esses que viram mais adiante e deram o que estava ao alcance de si, fosse qual fosse a dificuldade, a profissão ou o simples trabalho diário, para sempre (e sempre) criar COMUNIDADE. E, vendo mais longe?tratando-se de uma autêntica “inclusão” humana e humanitária de todas as forças positivas, pessoais e sociais, assim a intuição da “utilidade ao bem comum” com dignidade, alia-se à criatividade, frescura e sentido de viver, pois o objectivo final de uma Nova Humanidade está sempre lá, a interpelar “tudo” o que se estuda, ensina, trabalha, inventa. 2. Na “Cimeira do Milénio” da ONU, que decorreu em Setembro de 2000, os países membros assinaram uma DECLARAÇÃO DO MILÉNIO, que fixou oito objectivos de desenvolvimento específicos, a serem atingidos até 2015. O tempo passa! Estes ideais, chamados OBJECTIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÉNIO (ODM), ambiciosos para o horizonte de um novo milénio, poderão ser apresentados desta forma: 1. Reduzir para metade a pobreza extrema e a fome; 2. Alcançar o ensino primário universal; 3. Promover a igualdade entre os sexos; 4. Reduzir em dois terços a mortalidade infantil; 5. Reduzir em três quartos a taxa de mortalidade materna; 6. Combater o VIH/ SIDA, a malária e outras doenças graves; 7. Garantir a sustentabilidade ambiental; 8. Criar uma parceria mundial para o desenvolvimento. Setenta e cinco por cento da população mundial pobre vive em meios rurais e depende, directa ou indirectamente, da agricultura para a sua subsistência. É essencial promover a produção alimentar com segurança de forma a elevar a sua condição de extrema pobreza, daí o primeiro e objectivo fundamental de reduzir para metade a pobreza extrema e a fome. Mas, se é certo que será básico terminar com esta tremenda “guerra silenciosa” da fome, facto que soa a escândalo com a corrupção e interesseirismo de muitos dos governantes que enriquecem a ver as suas populações morrerem, o certo é que importa criar uma base estrutural que aponte o futuro melhor, e essa é a EDUCAÇÃO. Por isso, em linha programática da UNESCO-ONU estamos na Década para a Alfabetização (2003-2012), na sequência da Conferência Mundial sobre Educação para Todos (realizada em 1990, na Tailândia) e da Campanha Global para a Educação (lançada em 1999). E tudo, porque o desenvolvimento e a educação serão hoje o verdadeiro nome da justiça e da paz, pois contêm em si o núcleo capaz de derrubar a opressão e as ditaduras, promovendo caminhos de dignidade de vida e igualdade de oportunidades. Outro aspecto gritante, e que cada vez mais descerá às agendas planetárias, é a questão ambiental. Esquecida pelos sistemas económico-políticos (porventura) em geral, lembrada teoricamente nas horas dos “katrinas” da mãe natureza? Questão cada vez mais inadiável, que exigirá a dificílima reconfiguração dos modelos económico-sociais das sociedades ditas de modernas, mas assunto determinante para haver “mundo” para as próximas gerações. É neste contexto que vivemos a Década das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (2005-2015), que colocará o ano 2006 como o Ano Internacional dos Desertos e da Desertificação. 3. Todas estas referências de sensibilização são fundamentais em si mesmas, mas, ainda que criando toda a empatia e iniciativas em instâncias sociais e educativas diversas, carecem, todavia, da inteira corresponsabilidade da parte dos poderes de decisão política. Se assim não for, ‘mais coisa menos coisa’, tudo continua na mesma; se houver inteira e autêntica vontade, então podemos mesmo antecipar o futuro e nesta geração mudar mesmo a face do mundo. Nestes dias, este futuro possível está em jogo na grande e esperançosa Cimeira da Reforma da ONU, em Nova Iorque (14 a 16 de Setembro). Quem dera que todos estes urgentes ideais de Objectivos (de Desenvolvimento do Milénio) passem a salvadoras realidades! ?também dependerá da “força” de cada cidadão, a começar sempre pelo mundo mais próximo. Alexandre Cruz* *Centro Universitário de Fé e Cultura |