Perante a adversidade das forças da natureza, como o furacão Katrina que investiu e desfez a costa do golfo do México nos Estados Unidos, em particular a bacia do grande rio Mississipi, nós, que estamos longe, podemos oferecer apenas a nossa ajuda material, participando assim no esforço de reconstrução e o nosso apoio espiritual, rezando como pediu o Papa Bento XVI. Para além das polémicas, que abordarei também, importa estarmos atentos e reflectirmos, sobre as cada vez mais abundantes manifestações de desconforto e irritação da Mãe Natureza, para com a continuada agressão humana. Já não bastavam os duzentos mil mortos no maremoto da Indonésia, os fogos selvagens em Portugal e sul da Europa - que a prolongada e desgastante seca potenciou - , as terríveis inundações no pico do Verão no centro da Europa para, agora, a destruição ter atingido o coração das muitas viagens que a nossa imaginação percorreu, ao ler as páginas dos livros de Mark Twain. Muitos europeus viram sobretudo nesta desgraça mais um motivo para se atirarem aos americanos e a Geoge W. Bush, em particular. A política tem destas coisas e a oportunidade para se desembestarem com o “sherif” não foi desperdiçada. Certo é que, passados cinco dias, sobre o maremoto na Indonésia, os céus estavam cheios de helicópteros e militares americanos e quase toda a ajuda humanitárias tinha um carimbo “US aid”. É uma constatação, admitida pelo governo federal americano, que em Nova Orleães, passados os mesmos cinco dias, o cenário era de uma confrangedora desorganização na chegada da ajuda aos sulistas atingidos e de uma deficiente e preocupante avaliação dos meios necessários para a assistência aos compatriotas. Mas, eu, prefiro ver o lado menos negativo (positivo) destas coisas. O impressionante movimento de solidariedade humana em que todo o povo americano se envolveu. Voluntários chegaram de todo o lado e começaram de imediato a reconstrução. Na Europa já estávamos numa qualquer fila a exigir assistência do governo. A sociedade civil americana mobilizou meios financeiros formidáveis, antes mesmo do governo americano ter pensado em como actuar e a reconstrução já começou a cargo dos privados atingidos. Na nossa velha Europa ficavam todos a olhar para o governo e a barafustar na comunicação social, propondo comissões de análise a tudo e a todos. A evacuação ordeira de 800 mil de pessoas da cidade num dia e, mesmo assim, foram incapazes de retirar quem não tinha transporte próprio. Já pensaram o caos que seria numa cidade de Portugal? A preocupação da polícia em manter 1300 prisioneiros duma prisão de alta segurança controlados, durante os dias mais difíceis, para evitar fugas e o aparecimento de males maiores e o risco de vida que os guardas correram. Apesar disso, não evitaram o aparecimento de gangs armados. Quando, finalmente, a máquina de ajuda militar entrou em pleno os meios foram, de facto, impressionantes, mostrando toda a sua capacidade. Ingenuamente falharam numa das suas principais funções: a previsão e preparação. Para além de todas as falhas, incompreensíveis para uma nação com tantos recursos, preocupam-me as sentenças de alguns europeus que se esquecem facilmente de que não conseguem controlar os mais que previsíveis incêndios de Verão, que se mostram incapazes de pôr cobro aos actuais fogos em prédios da capital francesa, que não se acertam numa política comum de defesa ou internacional. Está na hora de ajudar aqueles que sempre estão disponíveis para com os Europeus, porque em matéria de julgamentos e de retirarem lições das tragédias os americanos estão anos-luz à nossa frente.
António Granjeia* *Administrador do Jornal da Bairrada |