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06-04-2005

Eutanásia em debate


Anadia

Numa iniciativa do Roatry Club Curia-Bairrada teve lugar, na última sexta-feira, dia 1 de Abril, no auditório do Museu do Vinho Bairrada, um colóquio/debate subordinado à problemática da Eutanásia - interrupção do tratamento do estado vegetativo persistente.

Um encontro que reuniu à mesa do debate Daniel Serrão, professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto; Manuel António, director do IPO HUC Coimbra e João Loureiro, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, entre muitos outros convidados, incluindo vereadores da autarquia anadiense, deputados, autarcas de Juntas de Freguesia, profissionais de saúde, etc.

O encontro contou ainda com a presença do autarca Litério Marques, Vasco Ribeiro, presidente do Rotary Club Curia-Bairrada e Frederico Teixeira (ex-presidente e fundador do Rotary Club Curia-Bairrada) que também deram o seu testemunho sobre o assunto em questão.

Foi em ambiente de alguma tristeza - pelo então débil estado e saúde do Santo Padre - que, num auditório, completamente lotado, se falou sobre um tema ainda difícil de abordar na nossa sociedade e sobre o qual muitas dívidas persistem, sobretudo no âmbito da ética e da religião.

“Trazer e levar conhecimento para poder intervir melhor na comunidade”

Quem estava à espera de ser esclarecido enganou-se redondamente. O colóquio/debate serviu realmente para tirar algumas dúvidas, mas dar origem a muitas outras, pois tratando-se de um tema tão difícil, melindroso e controverso, os argumentos pró e contra (eutanásia) acabam por dividir as nossas próprias mentes, causando profundas dúvidas e incertezas nos presentes.

Vasco Ribeiro, actual presidente do Rotary Club Curia-Bairrada que promoveu esta iniciativa, começou por explicar que esta é uma das missões dos Rotary “trazer e levar conhecimento para poder intervir melhor na comunidade, nos empregos, ocupações e profissões”, destacando próximos colóquios que os Rotary vão realizar. A saber: no 29 de Abril, na Mealhada, subordinado à temática da Cultura. Um evento que irá contar com a presença de Manuel Maria Carrilho e um outro, a realizar em Cantanhede, sobre a temática do HIV.

Frederico Teixeira diria também tratar-se de uma temática de grande actualidade e controverso, com profundas implicações éticas.

“Muitas dúvidas e tremendas incertezas”

Por seu turno, Manuel António falou da “evolução” da eutanásia ao longo da história. Eutanásia (palavra grega) que significa “morte boa”, tranquila e sem sofrimento, mas que para outros não passa de um acto de matar, dando a conhecer que já povos primitivos - tribos nómadas e pré-históricas praticavam a eutanásia, seguindo-se outros exemplos como os celtas, germanos, espartanos e gregos. Já no século XX, Hitler também foi apologista desta prática, responsável pela morte de muitos milhares de deficientes mentais, destacaria.

Ligado ao IPO, falou da sua experiência profissional, como médico, das lutes travadas diariamente no serviço que dirige e revelou que “até aos dias de hoje nunca ninguém me solicitou para pôr termo à vida, embora as pessoas saibam que o fim se aproxima rapidamente”.

Para este responsável, com muitas dúvidas e tremendas incertezas sobre esta problemática, a “solução/alternativa” passa por excelentes cuidados paliativos, com apoio constante à dor física e psicológica, conforto, calma, paz, sossego e terapêuticas antiálgica. Enfim, manter a dignidade até ao fim.

A Holanda, que legalizou esta prática a partir de 2002, também esteve em análise.

“Armadilha tecnológica”

Já João Carlos Loureiro falou da problemática no âmbito do direito e à luz do direito português. Contudo, não deixou de recordar que “o estado vegetativo persistente” é uma consequência do progresso da medicina “da tecnociência” que, para além dos benefícios, trouxe muitas dúvidas, sendo uma verdadeira “armadilha tecnológica”.

O causídico falaria do sujeito (pessoa e ser humano), das práticas (renúncia, interrupção de tratamento, interrupção da nutrição e hidratação artificiais), da cessação de tratamentos (vontade presumida, critério da futilidade, critério dos melhores interesses para o paciente), assim como da clarificação doutrinária (eutanásia voluntária e involuntária; eutanásia activa e passiva (omissão) e eutanásia directa ou indirecta).

Eutanásia: é sempre voluntária e activa

Para o professor Daniel Serrão, a eutanásia é uma situação em que uma pessoa pede a outra que a mate e essa outra pessoa executa esse pedido e, segundo o próprio, só existe uma eutanásia “a que é pedida e aceite”, portanto, na sua opinião, “ela é voluntária e com dois sentidos: vontade do doente que a pede e vontade do médico que decide executá-la. Por isso é também sempre activa”.

Falando da história real do espanhol Ramon San Pedro, que deu origem a um filme, premiado recentemente, disse tratar-se não de um caso de eutanásia, mas sim de um caso de ajuda ao suicídio.

O professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto não deixou de considerar que as pessoas, quando pedem a eutanásia, é por que estão no fim da linha. Pessoas que não têm recebido da sociedade, dos médicos, dos hospitais o tratamento e acompanhamento devidos - “o que me aflige é ver no nosso país pessoas tão mal atendidas, tratadas”.

Considerou de resto que “toda a dor tem tratamento”, o que importa é que “se criem centros e lugares apropriados ao tratamento da dor, do sofrimento” - unidades de cuidados paliativos que ajudam a que estas pessoas “tenham novamente um projecto de vida para o curto tempo de vida que lhes resta”.

Para este responsável esta é a temática que deveria estar a ser discutida - “os cuidados paliativos, a sua importância em instituições, ao domicílio e nos hospitais”.

Uma solução/alternativa, contudo consideraria também importante ter-se atenção e cuidado com a obstinação terapêutica que abre caminho para a eutanásia, concluindo que os cuidados paliativos são a solução para os doentes que, eventualmente, poderiam vir a pedir a eutanásia.

Catarina Cerca


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