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06-12-2004

A confusão do Presidente


Editorial

Apesar de, na última semana, ter percebido e escrito que a paciência do Dr. Sampaio se estava a esgotar com os ziguezagues na gestão do governo do Dr. Santana Lopes, sempre pensei que a dissolução do Parlamento fosse mais manobra dissuasora que uma eventualidade, a curto prazo. Pensava que era altura de pregar um real susto ao Primeiro-ministro, para ver se ele punha na ordem os seus correligionários do partido, recompunha, de vez, o seu governo e começava a dar alguma esperança e confiança aos portugueses.

Assim não entendeu o Presidente da República.

Se, eventualmente, teria alguma razão para estar indisposto com o Governo e o Dr Santana Lopes perdeu-a todinha na forma como agiu. Iniciou uma quase telenovela política, apenas porque não explicou aos portugueses o motivo da dissolução da AR e andou ao contrário do que o comum bom-senso lhe indicava. Primeiro, resolveu demitir um PM para só depois tentar arranjar explicações para a sua decisão quando ouvir o Conselho de Estado e os partidos políticos.

Haverá conselheiros que irão gostar muito deste atestado de incapacidade para o aconselhar. Vão aconselhar o quê? Dissolver a AR? Já está. Demitir o PM? Já o despediu. Marcar novas eleições? São em Fevereiro.

O Dr Sampaio vai convocar os conselheiros para um chá das 5, com uns scones à inglesa e ver um filme do shreck. Só mesmo o Dr. Soares vai gostar de estar presente e mesmo assim vai criticar a manteiga dos bolinhos.

Haja paciência e decoro.

O Presidente conseguiu colocar Portugal a viver uns tempos surrealistas. Para quem vivia preocupado com a instabilidade, não está mal. Se não vejamos:

A pré-campanha já começou, embora não haja decisão oficial e final sobre a dissolução do Parlamento. O Governo está em funções plenas e totais e assim ficará até ser demitido, ou, se demitir, (ninguém pensou nisso), ou então, até novo executivo tomar posse.

Claro que o mesmo vigorará para toda uma plêiade de entidades e instituições que sustentam um Estado como Portugal - estão em funcionamento e o seu normal funcionamento não está colocado em causa.

Depois, temos Orçamento do Estado, que agora ninguém quer. Alegadamente, terá sido o motivo da decisão presidencial - nem isso ficou perfeitamente esclarecido - vai ser votado e quase de certeza aprovado.

O Presidente da República colocou-se assim desnecessariamente na corda bamba.

O Presidente da República poderia ainda brandir o último dos seus argumentos - aquele de que haveria dúvidas na coesão da coligação, por parte do PSD. Até esse perdeu na forma como geriu o tempo da sua decisão. O PSD, com a decisão de sábado do Conselho Nacional, desfez o último fundamento do Dr. Jorge Sampaio.

Como disse Luís Delgado, a verdade é nua, dura e crua: Sampaio, como Presidente de todos, e garante do regular funcionamento institucional, “auto-dissolveu-se”.

António Granjeia*

*Administrador do Jornal da Bairrada


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