“A montanha pariu um rato”. A frase foi proferida por um cidadão da Gafanha da Nazaré no final da apresentação do estudo sobre a qualidade do ar na envolvente ao Porto de Aveiro e que revelou não existir motivo para preocupação apesar do incómodo para a vida dos residentes na cidade. Recebido o relatório final da ação do Instituto de Ambiente da Universidade de Aveiro (UA) que durante um ano estudou a qualidade do ar com medições e testes em simuladores, responsáveis da administração portuária e autarcas revelaram que o futuro se fará do aprofundamento das medidas mitigadoras. A movimentação de petcoke foi o mote para as queixas e para a consequente introdução de boas práticas e o estudo confirma que essa “ação popular” ajudou a melhorar resultados.
Foram realizadas três campanhas de monitorização (de 2 de Julho a 1 de Agosto de 2015, de 19 de Dezembro de 2014 a 20 de Janeiro de 2015 e de 5 de Maio a 4 de Junho de 2015) em três estações medidoras. Duas móveis estiveram na EB 2,3 Gafanha da Nazaré e na Escola Secundária da Gafanha e uma fixa da CCDRC que existe em permanência na Escola Básica 2,3 de Ílhavo.
A análise de partículas em suspensão (PM10) foi o alvo do estudo pelo impacto para a saúde quando excedidos os limites autorizados. Os dados apurados revelam que os valores medidos estão longe dos limiares de referência para a saúde pública. Há outros parâmetros que abordam outros aspetos da qualidade do ar. Monóxido de Carbono, Óxidos de Azoto, Benzeno e Dióxido de Enxofre ou metais pesados como crómio e cobre não encerram valores de metais que justifiquem alerta.
“A campanha de Inverno com ventos de sul apresentou os piores resultados. Fenómeno de escala regional. O IDAD fala de outras causas para lá do que se passa no Porto de Aveiro”, explica Maria Manuel, a responsável pelo Porto de Aveiro que acompanhou o estudo.
Nas campanhas de Verão regista-se evolução positiva associada a medidas mitigadoras. Com a humidificação e redução do tempo em cais os resultados entre a primeira e a terceira campanha foram visíveis. Com a simulação numérica estuda-se o comportamento dos efeitos do vento de norte e noroeste e com diferentes tipos de intensidade. A maior concentração dá-se a jusante da pilha de petcoke (9 microgramas por metro cúbico) salientando-se que “as areias têm um efeito barreira”.
João Pedro Braga da Cruz (APA) defende que a “a humidificação da pilha é essencial” tal como uma “barreira que corte o vento”, a “suspensão da movimentação com condições de vento” e a “instalação de uma estação de monitorização da qualidade do ar para partículas PM10” que permita ação em tempo real quando existir ocorrência de fatores de risco. A criação de um manual de boas práticas é assumido pela comunidade portuária como uma das apostas de futuro.
“Este relatório é uma avaliação que dá indicações em que devemos atuar. Primeiro, manter as práticas adotadas. Manter o petcoke no tempo estritamente necessário à passagem pelo Porto, operar com embarcações mais reduzidas, usar aspersão de água e parar a movimentação quando ocorrerem ventos fortes. E vamos trabalhar com o IDAD para definir as características para a barreira a construir a montante da pilha. O IDAD fez um ensaio com barreira de 15 metros para uma pilha de 10 metros”. O testes mostram que a eficácia de uma barreira estanque aumenta face a uma barreira porosa.
Braga da Cruz admite que as pessoas tinham razão de queixa por causa do pó que detetam nas habitações mas defende que o desconhecimento “cria receios” e este estudo é um passo para conhecer o que está a acontecer. “Dentro dos critérios internacionais o Petcoke não está classificado como matéria perigosa. Como tem partículas finas pode ser prejudicial em determinadas concentrações. O estudo mostra que a concentração não põe em causa a saúde das pessoas”.
O desconforto é outra dimensão do problema e nesse capítulo o administrador do Porto de Aveiro admite que “as pessoas vão continuar a queixar-se”. “No que diz respeito ao petcoke o monte de areia em zona portuária funcionou como barreira. Funciona como peneira. Se a barreira não estivesse ali a quantidade de passagem seria maior”. A aposta em medidas mitigadoras, nomeadamente a criação de uma barreira, deverá surgir no prazo de um ano a ano e meio. “Recebemos isto na semana passada. Existe a vontade de agarrar este assunto. Penso que dentro de um ano, ano e meio teremos a solução”.
A apresentação aconteceu esta terça, na sede da Junta de Freguesia, na ausência de técnicos do IDAD em gozo de férias mas o responsável da APA assume que quis cumprir com a promessa feita de revelar os dados e reforçar o “clima de cooperação institucional dos parceiros com a Autarquia e Junta”. “Tínhamos o compromisso de divulgar o relatório assim que o tivéssemos. Optámos por fazer a apresentação mesmo não tendo aqui técnicos do IDAD. Não queremos defraudar a confiança que depositam em nós”.
Carlos António Rocha, presidente da Junta de Freguesia da Gafanha da Nazaré, reuniu antes da apresentação pública com representantes da Associação para a Defesa dos Interesses da Gafanha da Nazaré que deram voz à contestação há cerca de um ano e registou ausências na apresentação pública do documento. “Seria mais agradável que pudéssemos ter sala cheia mas é o que temos. Agradeço aos poucos mas bons que vieram até nós. Seria importante que quando há qualquer coisa a tratar se lembrem que existe uma Junta. Além da CMI somos os que estamos mais perto da população. Gostamos de ser tratados como devemos e gostamos de ter a comunicação social por cá”.
O vice presidente da Câmara de Ílhavo, Marcos Ré, considera que o trabalho conjunto será sempre a chave para responder aos problemas. “Esta foi a problemática mais importante no Porto de Aveiro por causa do trânsito de petcoke. Queremos que as populações se sintam mais fortes e capacitadas. Divulgar este relatório é divulgar um trabalho que interessa a todos nós. Um porto proporciona desenvolvimento mas também um conjunto de problemas e são esses problemas que pretendemos resolver em conjunto com todas as entidades que tutelam o Porto de Aveiro”.
Aguarda-se agora o estudo do documento pela ADIG e uma tomada de posição que poderá surgir nos próximos dias. A Associação tem dado nota pública do agrado pela forma como os operadores têm vindo a trabalhar em medidas mitigadoras.
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