O expediente utilizado por algumas Câmaras Municipais para contornar os limites impostos pela Lei dos Compromissos pode não ser legal mesmo quando em causa está o interesse público. As autarquias, entre as quais a de Ílhavo, estão a dar andamento a concursos para salvaguardar o fornecimento de serviços considerados essenciais nomeadamente no campo da educação (refeições e transportes) mas contrariam disposições da Lei dos Compromissos no caso em que não dispõem de fundos positivos.
Alicerçadas em pareceres jurídicos as autarquias dizem estar seguras desse passo mas há especialistas que contestam o argumento. Em declarações à agência Lusa, Freitas Rocha, professor na Universidade do Minho, adianta que há três cenários possíveis: o Governo ou o parlamento altera a lei e permite exceções para evitar o estrangulamento financeiro das autarquias; as autarquias não aplicam a lei e sujeitam-se a sanções de natureza política, administrativa, criminal e financeira ou limitam-se a aplicar a lei.
Freitas da Rocha acrescentou que há uma quarta hipótese, mas “bastante remota” que passa pela câmara não aplicar a lei e o tribunal “considerar a Lei dos Compromissos inconstitucional e recusar-se a aplicá-la ao caso em concreto, dando razão à autarquia”.
Também o especialista em direito autárquico Fernando Gonçalves considerou ser ilegal a intenção das câmaras, afirmando que as autarquias “não podem invocar o interesse público quando se trata de incumprir uma Lei da República”.
Para o jurista Tiago Caiado Guerreiro, a questão reside “em saber o que é a definição de interesse público” e sublinhou que “qualquer lei tem o bom senso de prever situações excecionais e de interesse público”, pelo que o motivo invocado não lhe parece plausível.
Tiago Caiado Guerreiro disse que esta decisão da Câmara de Leiria “parece mais uma quezília política” e uma “manobra que alguns municípios coordenadamente estão a fazer para não cumprirem uma lei a que todos somos sujeitos”, afirmou à Lusa.
A Lei dos Compromissos do Estado, aprovada em fevereiro pelo Governo, com o voto contra de toda a oposição, impede as entidades públicas, como as autarquias, de assumirem despesas para as quais não tenham receita prevista nos três meses seguintes. |