As comemorações do 38.º aniversário do 25 de Abril de 1974, em Anadia, ficaram, este ano, marcadas pelas muitas críticas e preocupações relativas ao momento atual que o país atravessa, mas também pelo mau tempo e consequente ausência de população.
Para além do executivo camarário, deputados da Assembleia Municipal e dos autarcas das várias freguesias, poucos foram os anadienses que se associaram aos festejos. Isso mesmo foi referido pelo presidente da Assembleia Municipal, Luís Santos, no final das várias intervenções, deixando uma nota aos presentes de que o concerto da Banda de Ílhavo – Música Nova, realizado no sábado, dia 21, no Cineteatro, no âmbito das comemorações, embora gratuito teve muito pouco público. Na última quarta-feira, dia 25, o mesmo aconteceu com a sessão solene, no salão nobre dos Paços do Concelho. Contavam-se pelos dedos das mãos, os munícipes que compareceram ao evento.
Profunda crise. O deputado João Morais, da CDU, fez o discurso mais crítico em relação ao momento atual do país. A profunda crise económica e social em que o país mergulhou, contando já um milhão de desempregados e centenas de milhares de cidadãos sem proteção social, a que se junta o alastrar da precariedade, do empobrecimento dos trabalhadores e a necessidade de emigrar, foram aspetos focados pelo deputado que sublinhou ainda a existência de cerca de 2,5 milhões de portugueses a viver no limiar da pobreza, assistindo-se ainda a uma diminuição no acesso a direitos básicos como a Saúde, Habitação, Ação Social, Ensino e Cultura.
O deputado comunista teceu ainda duras críticas em relação ao definhar do aparelho produtivo; à estagnação e recessão económica; à diminuição dos salários e das reformas; à submissão às imposições da UE e “ao garrote de uma dívida externa inquietante e de uma especulação financeira que diariamente rouba os recursos nacionais”. Por isso, diz ser necessário “exigir uma rutura e mudança na vida política nacional que abra caminho a uma política patriótica e de esquerda, que responda aos problemas do desemprego, das injustiças, da pobreza, da dependência externa e da corrupção”.
Democracia e liberdade. João Tiago, líder da bancada do CDS/PP, optou por falar da democracia, liberdade e dos órgãos autárquicos: “os cidadãos anadienses numa democracia não têm apenas direitos, têm o dever de participar no sistema político que, por sua vez, deve proteger os seus direitos e as suas liberdades”, disse, referindo ainda que “uma maioria política não é uma via para a opressão”, assim como “nenhuma maioria, nem democracia, deve tirar os direitos e as liberdades fundamentais de um grupo minoritário ou de um indivíduo”.
Aos presentes disse também que “os partidos de oposição são livres para criticar as ideias políticas do partido da maioria e apresentarem as suas próprias propostas”, defendendo que no caso da Assembleia Municipal, os eleitos para este órgão “não se devem limitar a fazer uma vénia, aprovando as decisões de um líder autoritário”, na medida em que os deputados municipais “têm a responsabilidade de articular as suas opiniões da forma mais eficiente possível.”
Austeridade cega. Manuel Maria Cardoso Leal não deixou de manifestar preocupação perante uma política neoliberal radicalista, com efeitos económico-sociais mais graves e que penalizam os mais fracos e pobres. Reconhecendo que a crise tem razões internas e externas, não deixou de lamentar o despesismo nos vários níveis da administração; os consumos irresponsáveis e as exigências irrealistas. Cardoso Leal lamentou ainda que a “política de austeridade cega” e os seus efeitos nefastos agravem a recessão e dificultem o poder de recuperação das economias mais fracas. Daí, considerar urgente que se introduzam políticas de emprego; para a necessidade de avançar com um pacto de crescimento por forma a que as contas públicas possam ser regularizadas. “O Governo do PSD tem sido mais papista do que o Papa”, disse relativamente às políticas neoliberais com as quais diz ser “preciso romper”.
Dar a volta por cima. Dino Rasga, do PSD, para quem o 25 de Abril foi “inevitável”, considerou ser preciso reforçar e fortalecer o poder autárquico que está na base do poder democrático, pois é aquele que se exerce perto dos cidadãos. Por isso, entende que a reorganização administrativa não pode implicar perda das satisfações das necessidades das populações. Numa referência ao desemprego, “grande flagelo do país”, às crescentes dificuldades de vida dos portugueses, à instabilidade e contestação crescentes, defendeu que o país será capaz de dar a volta por cima: “acredito que os mais de 800 anos de história do país e as várias crises já ultrapassadas, nos ensinaram a dar a volta para sair desta situação que não é boa”.
Discurso corrosivo. Litério Marques, falando em concreto do município, lamentou o encerramento do serviço de Urgências do Hospital local, a sua substituição por uma Consulta Aberta “caótica, onde faltam médicos”, num concelho onde se agravam as condições de acesso aos cuidados primários de saúde.
O edil criticou duramente a reforma administrativa que diz valer “zero para Anadia”. Na sua opinião, em vez de se avançar com a extinção de freguesias, a reforma deveria começar pelos municípios: “Anadia não se importava de fazer parte de um grande órgão executivo da Bairrada, desde que a sede fosse em Anadia”, disse. Criticando a reorganização da estrutura judiciária, lamentou a ameaça que recai sobre o Tribunal de Anadia: “nunca aceitarei isso e amanhã vou a Lisboa defendê-lo”, uma vez que considera que não é legítimo que esta reorganização determine o esvaziamento do Tribunal, que poderá perder a Grande Instância Cível.
O excesso de burocracia e a interrupção da construção da futura Escola Básica e Secundária também não foram esquecidos. “O Estado decidiu, unilateralmente, parar a obra da Parque Escolar. Aquilo parece Chernobil. É uma tristeza”, acrescentou, dizendo-se “envergonhado” por aquela obra ensombrar todo o trabalho que o seu executivo vem fazendo no concelho, com obras de vulto em várias frentes, casos das obras da regeneração urbana (Curia/Espairo/Anadia/ S.João Azenha) que trazem incómodos à população “mas que têm de ser feitas” até porque são financiadas a 85% pela UE, sendo a autarquia responsável pela dinamização da economia e geradora de emprego: “damos trabalho às empresas e aos seus funcionários”.
Falhas de governabilidade. A terminar, Luís Santos sublinhou que, volvidas quatro décadas sobre a revolução de Abril, “o povo mostra-se cada vez mais desencantado com o incumprimento de algumas das promessas feitas, com as falhas de governabilidade de alguns que assumiram, ao longo de anos, de forma desastrosa e fraudulenta cargos políticos, ou de outros que, a todo o momento, procuram promover-se, para ocuparem lugares, num desfiar de interesses pessoais”. A Educação que “não encontrou ainda o rumo certo”; a diminuição dos apoios na Saúde e nas prestações sociais; o futuro da Justiça e do Poder Autárquico foram outros aspetos que focou.
Catarina Cerca
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