Hesitei bastante em escrever sobre este tema porque não sou jurista e porque tenho alguma relutância em ver o desporto apenas como um negócio. Pratico natação, fui treinador e sou dirigente desportivo amador, há muitos anos. Vejo o desporto como uma forma de nos engrandecermos como homens, de servirmos a comunidade, de melhorarmos a nossa performance física e não como uma guerra de influências ou um torpe palco de vaidades. Infelizmente, o desporto profissional, e o futebol preferentemente, não são actualmente mais do que um negócio que deixa muitas dúvidas sobre a sua honorabilidade. Os níveis de confiança dos adeptos nas decisões dos dirigentes, a desconfiança face aos valores astronómicos envolvidos nas transferências e salários de jogadores e treinadores, a lentidão e a complicação processual da justiça desportiva têm convergido para a desacreditação deste futebol, mesmo que a espaços, a selecção nacional vá salvando a honra do convento, agindo como antipirético para a alta temperatura em que o futebol ferve. A ideia geral que o cidadão comum tem do futebol profissional é que é gerido quase como uma grande máfia, emerso de casos e sempre envolvido em guerras intestinas, entre grupos rivais que lutam pelo poder na organização e, consequentemente, por um quinhão nas receitas do negócio. É questionável por isso, se a justiça nacional ou europeia, se devam retirar de todo este processo a coberto de serem assuntos estritamente desportivos e deixarem de fiscalizar este negócio. Afinal, em que difere este negócio da venda de frangos, chinelos tecnologia, petróleo ou serviços? A jurisdição e a fiscalização sobre um negócio multinacional não podem ser deixadas ao livre arbítrio de uma qualquer organização não governamental só por que é desporto. Afinal, a quem cabe a decisão se o assunto é desportivo ou de competência dos tribunais comuns quando existem dúvidas na interpretação da lei de bases do desporto que regulamenta este aspecto (bastante imperfeita diga-se)? À FPF, à FIFA ou ao Estado Português? Se alguma dúvida houvesse, os tribunais ditos comuns (o Estado por consequência) acharam-se competentes para intervirem neste caso, apesar de, como é seu dever, os juízes conhecerem a lei de bases do desporto e o disposto no seu artigo 47. Muito para além do folhetim de quem sobe ou desce de divisão, as organizações, que gerem o futebol profissional, estão preocupadas com o prejuízo na receita do negócio se forem excluídos os ditos três grandes das competições europeias ou a equipa nacional das competições internacionais. A receita é o valor a salvar. Parece mais importante do que verificar da justeza de uma inscrição de um qualquer jogador, mesmo que numa competição amadora, de ajuizar da velocidade atómica das decisões da sua magistratura desportiva, mesmo que leiam ou produzam pareceres de muitas páginas, cheios de conteúdo jurídico em tempo recorde. Imagine o leitor, para aumentar esta confusão, que o Gil Vicente, no limite, e até porque já não tem nada a perder, resolve continuar nos tribunais (que já aceitaram e validaram a sua causa não a considerando, portanto, estritamente desportiva) é despromovido. Entrega o património à Câmara Municipal, faz um acordo com outro clube da região em competição na FPF, que altera o seu nome para um similar de Gil Vicente, recebe da CM o património de volta e regressa à competição. Tudo dentro da lei desportiva. Aliás, nada de novo. Houve uma SAD, do centro do País, que fez o mesmo quando se viu a braços com processos de insolvência.
António Granjeia* *Administrador do Jornal da Bairrada Consultar: http://joaopedrodias.blogspot.com/2006/09/o-caso-mateus-na-perspectiva-do.html http://www.idesporto.pt/CONTENT/10/make_tree.aspx?lid=1 Diário de Aveiro |