1. Todos sabemos que não existem soluções instantâneas para os problemas estruturais, que se têm arrastado pelo tempo fora. Mesmo que fôssemos campeões do mundial de futebol, e muito boa foi a prestação da nossa delegação (comparativamente), claro que, no que se refere às áreas fundamentais da sociedade, tudo iria, como irá, continuar naturalmente na mesma. Ainda bem que as coisas são assim, “são como são”, e esperar o contrário seria não colocar “cada coisa no seu lugar”. Mal vai quando a emoção perde todas as fronteiras da razão, transpondo para a “euforia” as soluções de tudo. Não se peça ao futebol o que ele nunca poderá dar, mas reconheça-se na nossa vivência do mundial o mérito motivador e retire-se de mais esta experiência exaltante o sentido dos desafios tornados esforço e compromisso diário. Diante deste fenómeno de proporções impressionantes e incontornáveis pelo querer das “pessoas”, tanto não fará sentido ser “velho do restelo” como se Portugal não tivesse participado nesta competição mundial, como, do mesmo modo, será irrealista do Futebol realizar leituras interpretativas de toda a realidade, leituras essas ora “fatalistas” na hora das derrotas, ora “divinas” na hora da vitória em que se conclui rapidamente que “somos os melhores do mundo”! Talvez do mesmo modo, e pautando pelo equilíbrio, mesmo os mais pessimistas viveram horas de alegria motivadora na vitória, assim como os optimistas desenfreados souberam descer do lindo “sonho” à realidade. Afinal, o Futebol é só o Futebol! Mas como em tudo na vida o que está bem feito assim merece esse mesmo reconhecimento e apreço. A este propósito, será de sublinhar, e depois de tudo o que se possa dizer?, que, graças à gestão presente da instância competente, ao sentido de liderança e estratégia, é bom hoje sentir que a selecção de futebol - assim seja em tudo - não é fonte de problemas (como era até há poucos anos, quem não se lembra!) mas de alegria, motivação, energia positiva. Este facto, a transpor como exemplo para a vida diária, pode ser um sinal objectivo muito positivo, estimulante. 2. Há, naturalmente, opiniões para todos os gostos, sendo que no nosso ADN português está sempre uma costela de “travão”, de tristeza e pessimismo, que nos impede de “agarrar” com toda a alma aquilo que temos de fazer e que pode ser bom para todos. Contudo, teremos de centrar mais onde “pomos os pés”, a esperança e o sentido da vida, quando não da euforia incontida (dando importância demasiada ao acessório) depois passamos à ressaca do nosso “triste fado”. E aí carregamos novamente com o nosso arado de pessimismo e calculismo que nos impede de erguer as causas, os ideais, a esperança motivada e motivadora. Muito para além dos convites, contextos e oportunidades (sócio-políticas que sejam) não é por acaso que as pessoas saem à rua e partilham a festa com os seus símbolos coloridos. Não só no nosso país, mesmo em terras germânicas, habitualmente mais frias quer no clima quer nas personalidades, também aí se verificou toda a festa cantada, dançada e partilhada. É bom sinal! Viver os acontecimentos no que eles significam, assumindo a festa de forma saudável e simples, derrubando também este muro do racionalismo que pertence ao nosso código genético europeu, será algo de libertador e importante. Sendo verdade que, infelizmente, por vezes, a euforia deu ou dá lugar à emoção irracional e destruidora até da própria segurança colectiva, o certo é que, não se podendo ler o todo pela parte, o conviver e festejar de forma saudável como foi na generalidade, representa o encontro, a partilha, liberdade, sair de casa, movidos por uma causa comum, força de motivação que se renova e renova a vida. Algo que só mesmo o futebol neste mundo consegue. Mas, o “jogo” deverá continuar! 3. Que ficará, e que será feito, de toda esta energia positiva colectiva partilhada? Esta é a pergunta essencial?que, porventura, não fará mesmo sentido fazer. É a pergunta sobre o “depois” em que tudo, na realidade, volta ao mesmo. Se o mundial foi oportunidade para mais alguns portugueses despertarem em si mais a alegria, o “sonho”, a motivação (esta hoje a palavra chave da vida pessoal e social), o agarrar com energia cada dia de vida como se de uma “final” de tratasse; o aperfeiçoar a noção do “gosto em fazer bem”, vivendo em todos os “campos do jogo da vida” com mais esperança e responsabilidade? então, o Mundial, como energia motivadora, foi ganho mais ainda! Será caso para dizer com a canção: “Podes não chegar à luz, mas tiraste os pés do chão!... Corre mais!”
Alexandre Cruz* *Centro Universitário de Fé e CulturaDiário de Aveiro |