Por vezes, somos confrontados com atitudes e gestos dos nossos governantes que deixam bastante a desejar do ponto de vista ético por um lado e até referenciam ou indiciam alguma incapacidade governativa e que roça o autoritarismo. Tudo isto vem a propósito do eventual lançamento da obrigatoriedade do pagamento do imposto municipal sobre veículos, apenas via Internet.
Começo por esclarecer que sou o mais fervoroso adepto do uso da Internet em todos os serviços estatais e comerciais, desde que isso não implique a exclusão de muitos dos portugueses. A meio deste mês, a comunicação social fez eco duma notícia, proveniente de um departamento governativo e que aparece já como um facto consumado.
”A partir deste ano, será obrigatório o recurso à via electrónica para conseguir a respectiva guia de pagamento, já que, de acordo com os planos do fisco, as tesourarias, tal como os tradicionais pontos de venda, deixam de vender os dísticos” Claro que, desde o mais humilde cidadão que ainda lê jornais nacionais àquele que ouve, de fugida o telejornal, entre telenovelas e ainda passando por todos os comentadores e escrevinhadores da república, acharam que só poderia ser uma piada de mau gosto.
Então, os governantes iam obrigar todos, do litoral ao interior, a comprar o selo do carrito na Internet? Então, mas, só 30% dos portugueses têm Internet? Estes novos romanos (leia-se cobradores de impostos) estão loucos, ou quê? Passados poucos dias, percebemos, também pela mesma comunicação social, que, afinal os governantes a tinham usado como teste à sua governação e à aceitação da medida pelos pobres contribuintes. Assim e, em declarações à agência Lusa, fonte do Ministério das Finanças explicou que «um grupo de trabalho, coordenado por Luís Laço [inspector-geral da Direcção-Geral de Alfândegas e dos Impostos Especiais sob o Consumo] está a estudar essa possibilidade, que é uma entre muitas», mas que «ainda não está tomada uma decisão». Passaram duma decisão para uma possibilidade e ainda se acharam todos encantados porque testaram a popularidade da medida e a sua exequibilidade com a ajuda dos jornais e da televisão.
Alguns avaliarão esta “jogada” como excelente, eu vejo-a como degradante e reveladora do carácter menos sério de quem titula este departamento do estado. Mas existe um outro lado ainda mais nebuloso nesta pretensa medida que importa avaliar.
Duma penada, o governo preparava-se para retirar 3% de comissão a milhares de pequenos lojistas e passar proveito da venda dos selos para o sector bancário que detém o sistema de pagamentos pela via electrónica.
Com esta eventual medida, o governo dava, electronicamente, mais uma criteriosa machadada em milhares de pequenos comerciantes e aplicava mais um empurrão ao sector que mais lucros tem em Portugal - a banca.
Como se eles precisassem! Do lado eventual da poupança que justificasse a medida, penso sinceramente, a papelada, fornecida pela Casa da Moeda, era toda já paga pelo contribuinte e que aí não haveria proveitos para o Estado. A banca detém um quase monopólio, chamado SIBS, e que controla todos os pagamentos electrónicos lusos.
Ao invés de se preocupar em dar acesso universal à Internet, acabando com os monopólios da rede de cobre pela PT, o governo para dar um ar de inovação, “lixa” mais uns quantos lojistas e atribui uma “benesse” aos gordos bancos que, de concorrência entre eles, só usam o apelido e têm o privilégio de nos lançar verdadeiros “impostos”, digam-se comissões bancárias.
Para testar a verdadeira concorrência bancária, experimente o leitor comprar um cartão de crédito aos bancos e descubra por si mesmo as “enormes” diferenças de serviços e preços que todos têm.
A autoridade para a concorrência anda distraída? a fazer compras.
António Granjeia* *Admnistrador do Jornal da BairradaDiário de Aveiro |