Se, efectivamente, há pessoas que, quando nascem trazem inscrita, na incerteza do seu destino, uma missão secreta, Baden-Powell foi um desses homens. No mês em que se comemora o aniversário do nascimento do fundador do Escutismo, 22 de Fevereiro de 1857, o Agrupamento n.º 970 festejou os seus tenros 15 anos de vida. A festa aconteceu durante o fim-de-semana, de 10 a 12 de Fevereiro. A maior prenda veio de um escuteiro que fez a sua primeira noite de campo na Palhaça, Mário João Oliveira, que garantiu o apoio autárquico a uma satisfação antiga do agrupamento, a tão desejada sede no espaço destinado a outras valências, que está a ser projectado no novo plano pormenor da Palhaça. Garantia dada na sessão solene, que abriu oficialmente o fim-de-semana de aniversário, em que todos os escuteiros que passaram no agrupamento foram convocados à participação, sob o lema “Uma vez escuteiro, escuteiro para sempre.” “Tudo para formar jovens para vida” E tem sido assim, aos poucos e aos sonhos, que a história deste agrupamento vai somando anos. Quando dois casais decidiram pôr pé ao caminho, estávamos em 1991 na aldeia da Palhaça. Ao entusiasmo destes “4 pioneiros” somou-se o empurrão da Junta de Freguesia da altura e o empenho do Padre Manuel Oliveira, 1º assistente do recém-criado agrupamento. No arranque com apenas duas secções, exploradores e pioneiros, ao que se vieram a juntar, dois anos mais tarde, os alegres Lobitos e, por evolução natural, os Caminheiros. Na história destes 15 anos, passados em revista fotográfica na sessão de abertura, ficaram registos de acampamentos, acantonamentos, peregrinações, acções de apoio à comunidade, procissões e dinamização de eucaristias. “Tudo para formar jovens para vida, construir homens novos que metem mãos à obra para um mundo melhor”, segundo o chefe Paulo Martins. E, por falar em obra, adianta o mesmo chefe: “somos um agrupamento empreendedor, a construção do Campo de Formação Padre Horácio Cura, onde realizámos o S. Jorge em 1996, mesmo antes da inauguração. Foi um dos grandes sonhos que já realizámos, construído com a colaboração de todos aos fins-de-semana”. Um campo de formação muito completo e por isso elogiado por todos quantos têm passado pelas suas instalações, como recordou o Chefe Regional, também presente neste aniversário. “O campo reflecte a tenacidade e a capacidade de realizar desta gente da Palhaça”, acrescentando, porém, que “o investimento, a preocupação maior dos chefes, deve ser formar jovens felizes que não caiam nas ratoeiras que a sociedade hoje lhes coloca; o escutismo tem esta missão, construir pontes, gerar fraternidade autêntica e para isso a região precisa também de vocês.” Se, no início o 970, era sobretudo constituído por palhacenses, com o passar dos anos, têm sido muitos os que de terras vizinhas procuram o agrupamento para aqui se iniciarem no escutismo e nos ensinamentos de Baden-Powell. Houve até quem aqui fizesse a sua formação e daqui partisse para chefiar agrupamentos vizinhos. São estas pontes que o pai do escutismo defendia, quando falava, que para alcançar a felicidade, é preciso contribuir para a felicidade dos outros. E disso que se trata também quando chega da hora da partida, “partir para uma vida verdadeira e livre, na sociedade dos homens, procurando deixar o mundo sempre um pouco melhor do que o encontrámos” Algumas histórias de amor Embora não tenham sido muitos os que, tendo partido, ou passado pelo agrupamento, compareceram a este fim-de-semana de aniversário, eles aí andam, “na sociedade dos homens” com a lei de escuta gravada no coração. Em vidas distintas os que se encontraram aproveitavam o convívio da sessão para partilhar memórias: “Lembras-te daquele acampamento do trovão, em Paranho de Arca?”. Era impossível não se lembrarem, a julgar pelo olhar e pelos sorrisos quando alguém recordava: “tanta chuva e nós teimámos em ficar, quando depois de uma noite de ameaças, um trovão estremeceu a terra bem perto de nós pela manhã”. Só precisavam de tempo porque, se mais fossem, as memórias davam uma noite inteira de gargalhadas e boas recordações. No sábado, o agrupamento e os “escuteiros para sempre” que aceitaram o desafio, regressaram ao passado com um dia recheado de actividades no Campo de Formação onde acantonaram, depois de um Fogo Conselho, onde não faltaram os frequentes sketches de humor e os jogos a envolverem pais, familiares e amigos. Foi neste ambiente tipicamente acolhedor e familiar que, ao longo destes 15 anos de escuteiros também nasceram e cresceram algumas histórias de amor que já resultaram em matrimónio. Segundo alguns são histórias que podem resultar de forma positiva para quem as acompanha de perto: “na qualidade de chefes podemos com a nossa vida, de casal ou não, fazer a transmissão de valores, de família, ser exemplo, referência, seja na qualidade de casal seja na de pais.” “Uma grande forma de vida” Quando, no final da celebração de domingo, numa roda gigante no adro da igreja se entrelaçam as mãos para juntos repetirem a oração de escuta, percebemos o porquê da emoção, quando alguém que partilha connosco, andou meia vida nos escuteiros, “dos 9 aos 25” e nos confidencia, com algum saudosismo, uma semana depois de fazer a sua partida, que isto fez toda a diferença na sua vida. “ Cresci para fora, para os outros, no dia-a-dia, sou muito mais extrovertido do que era, isto é uma grande forma de vida” disse-nos o Nelson sob o olhar orgulhoso de quem mira um herói, ao lado o seu irmão Daniel que já lhe vai no seguir das pisadas há 7 anos, “entrei por influência do meu irmão e gosto bastante disto, sobretudo do espírito de equipa que vivemos, e na minha há muito”. Baden-Powell ficaria certamente muito orgulhoso se, da sua janela no Quénia, pudesse, em sonhos, olhar, naquele domingo de sol, aquela roda de gente. Certamente as suas palavras vestiriam bem esta ocasião: “Acreditai que Deus nos colocou neste mundo encantador para sermos felizes e apreciarmos a vida (...) Vede sempre o lado melhor das coisas e não o pior.” Celebrar quinze anos de vida de um agrupamento pode muito bem passar por aqui, apesar de tudo: ver sempre o lado melhor das coisas. Catarina PereiraDiário de Aveiro |