O DIA 4 DE DEZEMBRO DE 1980 FICARÁ PARA SEMPRE GRAVADO

O dia 4 de Dezembro de 1980 ficará para sempre gravado na história de Portugal como uma data trágica.

Nessa noite fria e invernosa, morreram o então primeiro-ministro de Portugal, o ministro da defesa nacional e todos os seus acompanhantes.

Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa estavam a refundar e a refazer Portugal quando faleceram. Seis anos depois dos inebriados tempos revolucionários, pressentia-se que mesmo com a possível perda da eleição presidencial onde se encontrava envolvido, Francisco Sá Carneiro estava a conseguir mudar a imagem dum Portugal sem lei, dum Portugal desorganizado, dum Portugal rumando a um azimute inexistente no horizonte colectivo.

Para além da capacidade de antecipação do primeiro-ministro, da sagacidade política de Amaro da Costa, o governo estava a fazer acreditar os Portugueses que a liberdade conquistada seis anos antes, podia significar muito mais do que libertinagem, mais que simples despautério, melhor do que desordem ou desorganização.

Passados 25 anos, o Portugal de hoje não conseguiu sequer encontrar uma causa ou uma razão para classificar o triste acontecimento em acidente ou atentado. Arquivou o processo no ano de 2000 por falta de provas e por aí se ficou, mesmo quando quatro das sete ou oito comissões de investigação pensaram julgar que de um vil atentado se tinha tratado.

Mas os homens desaparecem e deles ficam a memória e os seus actos.

Mas, em Portugal também fica a saudade.

Lembrei-me, de nestes dias em que experimentamos a saudade, distantes o suficiente para que mesmo os adversários de então, já possam qualificar Francisco Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa de patriotas, de convidar o leitor para uma reflexão.

Mais do que uma reflexão será um exercício de redução ao absurdo tão do gosto dos matemáticos ou filósofos.

Como seria Portugal se estes personagens não tivessem tragicamente desaparecido?

Pensei sobre este assunto não por um qualquer devir saudosista, tão ao gosto daqueles que não conseguiram acompanhar as bolas saltitantes do livre pensamento que o poeta António Gedeão “cantou”.

Este exercício, que vos proponho e cada um deve fazer no silêncio do seu pensamento interior, talvez sirva para imaginarmos como colectivamente deveríamos ter evoluído, que obras deveríamos ter ou não permitido construir, que sociedade desejaríamos refundar, que educação precisaríamos, que saúde deveríamos organizar, que lei e ordem necessitaríamos ter, etc ?Eu por mim bastava-me que o chamado monstro orçamental não tivesse crescido desmesuradamente, que tivéssemos sido mais sérios a usar os dinheiros europeus em proveito colectivo e não em bombas para acelerar no desajustado obreirismo do betão alcatroado.

Enfim, que o fundamentalismo ambiental pudesse conviver com a necessária competitividade industrial e que a solidariedade social não tivesse sido apenas uma bandeira de propaganda e não uma bandeira de honra que nunca deveríamos deixar cair no terreno da batalha contra a injustiça e a miséria. E por falar em injustiça que a nossa justiça tivesse conseguido julgar Camarate. Se o tivesse feito, podia continuar a ser má como hoje, mas pelo menos não sentíamos todos o que dela achamos hoje. Não presta.

António Granjeia*
*Administrador do Jornal da Bairrada
Diário de Aveiro



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