Sou um «europeísta» convicto. E não faço a coisa por menos: considero a União Europeia como a maior e melhor realização de cooperação pacífica entre nações na História da Humanidade! Outros exemplos houve de «união» em vastas partes da Europa - por exemplo, com os Romanos, Carlos Magno, Carlos V e Napoleão - mas sempre baseados na coacção e na força militar. Desta vez, a União Europeia, então com o nome de Comunidade Europeia, nasceu como um projecto de paz, a seguir à segunda Guerra Mundial, para evitar que a Europa fosse outra vez devastada como o fora por duas guerras mundiais que entre si mediaram 21 anos. E ninguém pode negar o sucesso de, neste meio século, ter assegurado a paz e o desenvolvimento entre os seus Estados-membros. De tal modo que se tornou um pólo de atracção para outros países e um exemplo para processos de integração tentados em outros continentes. Portugal aderiu há 20 anos, e a isso deve em grande parte a sua modernização recente e até a consolidação da democracia. Vivemos agora, na sequência da rejeição em alguns países do projecto de constituição europeia e do fracasso da última cimeira de governos, numa fase de impasse e de descrença. Não é a primeira vez que tal acontece, mas vozes autorizadas afirmam que esta é a pior crise da sua história. Há quem a explique por falta de um inimigo externo, depois da derrocada do império soviético. Ou, porque o último alargamento a mais dez países pode abanar o conforto dos membros mais antigos. Outras razões, enfim, são apontadas. Mas novos desafios e ameaças - nomeadamente a globalização e o terrorismo - obrigam a relançar o projecto europeu, com mais coordenação das políticas económicas e de segurança. Só que esse relançamento não poderá ser feito nos mesmos moldes que no passado, porque, entretanto, o mundo mudou. A Europa está a perder terreno, face aos concorrentes em matéria de produtividade e crescimento e, por isso, a ver aumentar o número de desempregados que já chega a vinte milhões, e a sentir que é impossível sustentar o seu modelo social, o famoso «wellfare state». Se o quiser manter, terá de recuperar a sua capacidade de competir, apostando nas áreas do futuro, como a inovação tecnológica, a investigação ou a educação - mas em termos que funcionem! À escala de Portugal, o problema é semelhante. A par de uma maioria que julgo continuar a ser favorável à integração na Europa, ouve-se um crescente rumor de reservas e críticas - o que é saudável. Ainda que algumas dessas reservas se inspirem na visão mercantilista de quem só sabe andar de mão estendida. Ora Portugal, como qualquer outro país, não está livre do desafio de se tornar mais competitivo, se quiser manter o seu bem-estar. Mas, para tal, há coisas que só os portugueses podem fazer por si mesmos, sem esperar pelos outros - por exemplo: na eliminação de tantos desperdícios; na revisão de certos «direitos adquiridos» insustentáveis, como o debate em torno do défice do Estado tem posto a nu; e no melhor aproveitamento dos recursos para criar mais riqueza. É um desafio que se impõe aos políticos, é claro, assim como a cada cidadão. Manuel M. Cardoso Leal * * Antigo Secretario de Estado da Agricultura (governo de Guterres)Diário de Aveiro |