A OPINIÃO DO POVO

As páginas editoriais do “New York Times, ”incluem sempre uma secção de “Cartas ao Editor”.E eu, gosto de ler o que pensam os leitores daquele matutino Essas cartas são uma espécie de inquérito à opinião pública. Num dos últimos números, a maioria das cartas glosava a chamada “crise” do “Social Security”. Os republicanos dizem que o sistema está em crise, e que é preciso uma reforma drástica e rápida. Os democratas afirmam o contrário: que o sistema está solvente, e que só necessitará de reforma lá para dois mil e cinquenta e tais. Como se vê, há uma diferença de concepção e de cálculo, entre liberais e conservadores .

Há anos que os conservadores republicanos, vêm procurando dar o golpe de misericórdia no “Social Security”, instaurado no governo do Presidente Roosevelt, depois da Grande Depressão Americana, que lançou na miséria milhões de trabalhadores e imigrantes.. Ainda conheci alguns que tiveram de regressar aos Açores por esmola, depois de perderem tudo quanto tinham angariado com o seu trabalho, e que, anos depois, voltaram, quando a situação melhorou .Foi então que Roosevelt criou o Seguro Social, destinado a servir de “pára-quedas” aos da “mó de baixo”, em situações de crise ou desemprêgo.

O termo “social”, foi sempre um ôsso duro atravessado na garganta dos conservadores republicanos. Para os da ala direita, o “social”, soa a socialismo,, e este, em seu entender, não pode deitar-se na mesma cama da livre iniciativa.”O governo não e solução, mas sim o problema”-dizia o falecido presidente Reagan. E o engraçado é que, apesar do governo ser “problema”, todos querem ser governo. Para estes, tudo deve funcionar como um negócio de compra e venda e respectivo lucro. A doença deve ser explorada como um comércio qualquer, com um presidente e vice presidentes ganhando milhões de dollars por ano A educação, tambem um negócio particular. Tudo em regime de mercado, de concorência livre. E quanto a plano de reforma, que cada um faça o seu, e em vez de pagar para o Seguro Social, que invista na Bolsa esse dinheiro. Este projecto de livre iniciativa, de cada um gerir o seu próprio destino, tem o apoio da maioria das pessoas que, pelo seu talento e preparação académica ou profissional estão aptas a triunfar na vida.

O mau desta teoria neo-conservadora, é ser, em certa medida, anti-cristã. O nosso Presidente, quando tomou posse pela primeira vez, prometeu ao pais um governo conservador “de compaixão”. E como o nosso Presidente é um cristão convicto, “born again”, ou renascido, acreditamos que assim seria O pior é que, compaixão e capitalismo selvagem não condizem. É como o azeite e a água. Não ligam. O que Roosevelt fez, foi criar um “capitalismo com face humana”. Diferente do capitalismo selvagem de exploração do homem pelo homem.

O pior é que, “compaixão”, não consta do diccionário das gentes da alta finança. Negócio é negócio. E uma coisa exacta, regiulada pelas colunas do Deve do Haver. Negócio implica lucro. Sem lucro, não pode haver negócio. Em negócio não pode haver compaixão. É como a Natureza, Não tem compaixão por ninguem. Tudo está programado segundo as leis naturais da física, da química, da gravidade, etc. O maremoto do sueste asiático, não teve compaixão por pobres ou ricos. Levou tudo na enxurrada. Se o sismo mexeu com o fundo do mar, era lógico e inevitável, que as águas agitadas se atirassem contra a terra. Assim são as leis do mercado. E sem lucro o mercado não pode funcionar. E a lei natural do lucro e, “quanto maior, melhor”. E natural, humano e compreensível.

E foi para servir de pára-choque às tropelias e incertezas do mercado, ou dos cataclismos naturais, que os governos inteligentes e humanos, criam programas “sociais” para amortecer a queda dos mais débeis e fracos elementos da sociedade:: os incapacitados fisica ou mentalmente, e os menos preparados para entrar com ê3xito, no cada vez mais competitivo e feroz mercado do trabalho e das competências,

Afirmam os defensores do Seguro Social criado pelo Presidente Roosevelt, que o sistema proposto pelo governo do sr. Bush, não obstante as prováveis boas intenções, poderá ser um desastre, para milhões de americanos menos preparados para entrar na grande corrida competiva, de preparar por suas próprias mãos, um sistema de seguro pessoal, que o ajude na doença e lhe garanta uma reforma na vélhice. O que os conservadores americanos têm em mente, é um tipo diferente de todos os sistemas em uso em todas as maiores e mais produtivas nações democráticas do mundo. Na Europa, a maioria dos trabalhadores têm pelo menos três ou quatro semanas de férias , reforma compativel, seguro de saúde, abono de familia etc. Tambem lá existem problemas, sem dúvida, e graves. De qualquer modo, quer aqui quer lá, qualquer sistema que queira ser justo e estável, não pode prescindir de uma concepção humanística de compaixão pelos irmãos mais vulneráveis da sociedade.

Manuel Calado*
Jornalista nos EUA
Diário de Aveiro



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