NA QUINTA DAS GOVERNANÇAS

1 Navegando numa certa “cultura do entretenimento” em que se vai transformando a realidade social, o desafio a um arrepiar de caminhos terá cada vez mais oportunidade. Acima de quaisquer perspectivas particulares (mesmo de horizontes políticos desta ou daquela ideologia), estará em causa a própria dignidade de muitas actividades da sociedade que têm o seu espaço próprio e que não precisam de entrar em nenhuma ‘quinta’. Ou qualquer dia, para manifestar a sua própria existência (em que a TV ‘cria’, pela visibilidade, o acontecimento), tudo quanto existe terá de ir para o canal X, e numa desconstrução até ao irrisório cómico em que todo o calão mais baixo é, pela exuberante aclamação, elevado a linguagem quase-cultural?! Chegará um ‘vive e ri’?!

Apesar de muita indiferença social, imagem de marca da nossa época, há uma multidão de pensamentos-vozes que (na falta de tempo) em silêncio gritam em coro, apelando, a bem do futuro, para que não se confundam os planos: a sério, a sério! A brincar, é a brincar! Acolhendo o natural sentido lúdico como caminho pedagógico, numa gestão situada das naturais fronteiras, o certo é que brincar demais com coisas bem sérias, numa sub-versão de realidades, na constante troca de planos fará com que a criança-adolescente-jovem-adulto mais cedo ou mais tarde leve a própria vida a brincar(?). Os “porquês”, alicerces, fundamentos, sentidos e significados da vida vão ficando cada vez mais pela rama da fractura, fragmentação?

2. Às celebridades que a si mesmo se endeusam, ou que pelo já total des-preconceito têm como seu auto-hino de glória o ‘baixar’ o mais possível numa deseducação heróica? só mesmo uma quinta para estar! Governando-se a si mesmo com os milhões que as televisões lhes pagam, chamando as coisas pelos nomes no país da liberdade proclamada, arrepia pelo ‘nada’ em que vivem e que são infeliz escola de falsa-liberdade. Depois, admiramo-nos de muitas crianças não respeitarem os pais ou os professores! Brincam connosco, como nós brincamos com coisas sérias! ?e será que o Sr.Presidente da Câmara, de nome Adelino Ferreira Torres terá algum voto nas suas futuras eleições?!

Será necessário um código de ética política que evite a entrada de governantes em concursos degradantes? (Não concordamos; preferimos acreditar que o bom senso há-de sempre imperar!) Além de sua pessoa, mas deste caso “tipo” (de que outrora já falámos) o único problema que se lhe seguirá não será ele mesmo, mas o que representa. Sabermos que existe uma autoridade política a fazer novela para manter a imagem viva desafia o drama das populações que (esperemos que não!) já ligam muito mais à ribalta qualquer que ela seja do que à própria verdade e seriedade. Com toda a respeitabilidade social, como deverão ser interpretados os votos que tiver?? Serão sinal grave de menoridade cultural de um povo? Ou, então, serão mais umas eleições a brincar!? A inadiável dignificação da actividade política merece mais e bem melhor.

3. É urgente a “reinvenção da governança”! O apelo vem do Professor Adriano Moreira, na magnífica Lição de Abertura do Ano Académico da Universidade de Aveiro, que decorreu em Sessão aberta, a 6 de Outubro. Lançando o seu olhar, transversal, sobre a realidade social envolvente, na conferência “Estão as Ciência Sociais Prontas?”, convida-nos o Professor a passar do “saber” à “Sabedoria”. Das bases de dados, da sociedade da informação e comunicação, da pesquisa diária na Internet, a passar a uma cultura da vida, da recepção de informação positiva, que, de modo integrado, construirá em cada um o gosto renovado de edificar a comunidade. As ciências sociais, na contemporaneidade, apresentar-se-ão com a nobre missão de dignificar a realidade da(s) comunidade(s), dando-lhe um carácter em que todas as viagens do pensamento e da realização humana sejam reais e com significados pelo menos humanitários.

4. Os universos da governança vão abrindo o horizonte para os diversos níveis. O Prémio Nobel da Paz deste ano sintoniza com o espírito das Quintas Ecológicas que vão sendo desenvolvidas um pouco por todo o país e mundo. É a urgência de bem ‘governar’ a própria natureza. A Queniana Wangari Maathai, bióloga de formação, primeira Africana a ganhar tamanho reconhecimento Nobel, procura estabelecer mais paz e harmonia entre o homem e a natureza. Ao fim de três décadas, no Quénia, liderando movimento ambiental que plantou 25 milhões de árvores, deseja ser um sinal da purificação ambiental que combata a crescente poluição e as graves questões ecológicas do planeta.

Também da memória do super-homem Christopher Reeve (falecido há dias após 10 anos da fatal queda de cavalo) vem o apelo a uma maior sensibilidade diante da vida. Com coragem de mérito invulgar, mesmo agarrado à sua cadeira de rodas, foi super-voz activa em questões políticas e sociais, nomeadamente em aspectos referentes à pessoa com deficiência.

Na vida real, em que não existem super-homens, existirão pessoas que terão de ir cuidando sempre mais da grande ‘quinta’-global! Algumas pequenas quintas precisam de uma certa limpeza, outras num desenvolver de ‘ecologia espiritual’ chamando o virtual aparato para a realidade na verdade. Ao menos se lá, na quinta famosa, plantassem umas dezenas de árvores!...

5. E, depois de tudo, que novos mecanismos de sensibilidade múltipla reinventar diante da nova realidade social?

Alexandre Cruz*

*Director do Centro Universitário Fé e Cultura da Universidade de Aveiro
Diário de Aveiro



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