Num País que debate, profundamente, os meandros escondidos do futebol, que se revê em pretensas celebridades instantâneas ou fabricadas que nunca perceberão o significado da palavra decoro e que se incomoda e diverte com as manobras políticas mais rebuscadas de alguns comentadores e as nabices de ministros, nada mais natural que não dar atenção àquilo que, de importante, se vai passando. As nossas TVs, mas não os jornais nacionais, passaram quase em claro o recente 2º Congresso Nacional da Associação Cristã de Empresários e Gestores cujo tema foi “Ética: Factor de Realização e Progresso”. Este congresso serviu para aprovar e apresentar publicamente um Código de Ética que esta associação pretende lançar na sociedade portuguesa e em especial no meio empresarial nacional. A ACEGE dinamizou um debate em torno dos valores e práticas dos empresários e gestores portugueses que, desse modo, procuraram criar um código que reúna uma série de normas e princípios para uma conduta empresarial e de gestão que vá para além da lei. É uma refrescante brisa que sopra sobre o imediatismo de algumas decisões quotidianas, que, em nome de um pragmatismo, muitas vezes exagerado, entorna e faz descarrilar empresas, e mais desconcertante do que isso, as vidas de empresários e colaboradores. Um dos rostos desta associação, o empresário José Roquette, deu algumas entrevistas a colegas nossos, defendendo que os gestores começaram a perceber que, ao terem preocupações éticas, as empresas podem ganhar em imagem pública e eficiência, a médio e a longo prazo. Com efeito, na sua entrevista à Rádio Renascença afirmou “A ética não deve ser assumida apenas para a empresa ter uma boa imagem pública, quase de relações públicas, porque senão falha uma das dimensões mais importantes que a ética pode trazer às empresas, designadamente conjugar o projecto da empresa com o projecto de vida dos seus colaboradores e conseguir a sua sintonia, o que melhora muito a eficiência das empresas.” Mas, onde podemos ver e sentir esta tão apregoada ética? Por exemplo, sabe-se que quase metade das empresas portuguesas dá prejuízo. Esse é o primeiro problema de ética nas empresas, mas também dos consumidores que preferem pagar mais barato. É necessário perceber que o nosso “desenrasca” e comprar “baratinho” afecta a saúde das nossas boas empresas, porque favorece a concorrência desleal de empresas que não passam da cepa torta, que não querem crescer e vivem do imediatismo que rende, mas não dá sustentabilidade. Num recente relatório da Mckinsey afirma-se que a nossa produtividade é baixa muito em função da informalidade (economia paralela) da nossa economia que atinge os 25%. Esse é, para já, o grande desafio da nossa economia. Não vale a pena apregoar e exigir que o fisco seja eficaz, se quase todos nós fingimos que não vemos as irregularidades. E este factor tem que ver com tudo. Empresas mais fortes têm necessidade de melhores colaboradores. Os bons colaboradores não são dispensáveis pelos empresários. E isso leva-nos a outro factor em que a ética empresarial tem sido colocada em causa: os despedimentos. É importante avaliar a dispensa dos trabalhadores também pelo lado humano da questão e não apenas pelo lado material e de rentabilidade das empresas. Mas como compatibilizar e balancear estes dados numa economia débil e em que os trabalhadores, que são consumidores, a minam diariamente? Como perceber o problema quando vemos as cotações em bolsa de grandes empresas subirem em função dos despedimentos que fazem? Penso que é aqui que este congresso terá relevância se conseguir criar junto dos empresários, e estes junto dos seus colaboradores e empregados, uma cultura de honestidade e de verdade na gestão. É fundamental os trabalhadores sentirem que laboram numa empresa estável e próspera e por outro lado os gestores seguirem um código moral que possa ir para além da lei. Mas as leis também devem cuidar destes problemas e muitas vezes os imobilismos legislativos são causadores de muito maiores instabilidades e injustiças. António Granjeia agranjeia@jb.pt Administrador do Jornal da BairradaDiário de Aveiro
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