O terramoto apareceu de onde menos se esperava.
Todos tínhamos medo e receávamos um desaire da selecção de futebol mas o sismo não foi futebolístico. Acabou por aparecer na política com epicentro em Bruxelas e ondas de choque estendendo-se até Lisboa. Nenhum sismólogo político previu tal acontecimento perturbador da vida nacional.
É importante perceber que o Presidente da Comissão é designado pelos governos dos Estados-Membros e, seguidamente, sujeito à aprovação do Parlamento Europeu. Esta dupla legitimidade confere-lhe uma autoridade política que irá exercer em diferentes situações como por exemplo, a designação dos outros membros da Comissão, que estão sujeitos, em conjunto, a um voto de aprovação do Parlamento Europeu. Além disso, o Presidente define as orientações políticas de enquadramento da acção colegial da Comissão. Igualmente, organiza os trabalhos da Comissão, convoca e dirige as reuniões do colégio dos comissários, podendo atribuir-lhes a responsabilidade de actividades específicas ou constituir grupos de trabalho. Por último, o Presidente representa a Comissão. Para este efeito, participa nomeadamente nas reuniões do Conselho Europeu e do grupo dos sete países mais industrializados e da Rússia (G8), bem como nos debates mais importantes no âmbito do Parlamento Europeu e do Conselho de Ministros da UE. O recente Tratado de Nice reforçou a autoridade política do Presidente, atribuindo-lhe a possibilidade de alterar a repartição das responsabilidades dos comissários durante o mandato e de lhes pedir a demissão.
Pela evidente importância do cargo estou de acordo com o empenhamento de um português neste cargo. O problema de ser o actual Primeiro-Ministro, o Dr. Durão Barroso, é absolutamente aceitável (na hora em que escrevo estas linhas ainda não sei qual a decisão do mesmo sobre o assunto) e é até compreensível num plano pessoal e humano: trata-se do alcançar de um cume na carreira de qualquer político e que, talvez nem ele ousasse imaginar. Tanto mais para quem, como ele, é especialista em relações internacionais, tem uma notável capacidade de negociação e é respeitado nos fóruns internacionais. Por outro lado se Durão Barroso não aceitar, pode ficar eternamente com aquela impressão, talvez trespassando todo o seu futuro trabalho de Primeiro-Ministro, de ter perdido uma oportunidade única. Analisando no plano político é óbvio que Portugal tem a ganhar em termos de prestígio e de influência no espaço europeu e mundial. Não acredito que haja portugueses de bem que não sejam sensíveis a esta projecção internacional do nosso País. Perdemos esta hipótese uma vez com Guterres (por razões pessoais) e estas ocasiões não aparecem amiudadamente. O que é lamentável é que não haja um empenhamento nacional, como o que foi exigido para o caso do comissário Vitorino, havendo ainda dúvidas nos partidos da oposição de que esta nomeação é uma excelente oportunidade para Portugal.
As análises sobre o tema vão apaixonando os comentadores e fazedores de opinião pública. Sobre a fuga de Durão, sobre a escolha do próximo PM e eventuais conspirações palacianas, sobre a convocação de eleições, etc, etc… Mas a verdade, é que os portugueses sempre votam em pessoas e esquecem-se que deveriam era escolher programas de governo que normalmente não lêem. Por isso, as quebras de compromissos não são personalizáveis e consequentemente, nada mais natural do que o partido vencedor querer terminar a legislatura. Não sei qual a personalidade ideal para suceder no PSD e no Governo, mas o que tenho a certeza é que é ao partido do Dr. Barroso que cabe essa escolha e que só seleccionará o presidente do governo se o Senhor Presidente da Republica assim o entender. Os governos são nomeados pelo PR, sendo naturalmente Primeiro-Ministro a pessoa que o partido mais votado indicar. Não tenho dúvidas o PR vai cumprir escrupulosamente a Constituição da República e retirará as consequências possíveis: o Governo emana da Assembleia da República, na AR existe uma maioria que se manterá, o maior partido dessa coligação designa o substituto PM e nessa circunstância será indigitado pelo PR para formar Governo. Não me parece que o Senhor Presidente vá querer voltar ao tempo dos governos de iniciativa presidencial, nem me parece que entenda que as eleições sejam a alternativa que gere menos instabilidade. Também não é ao PR que cabe opinar sobre a sucessão dentro de um determinado partido. Estou absolutamente convencido que o Senhor Presidente da República vai usar da mesma lógica que anteriormente teve para com a demissão do Eng. Guterres: pediu ao PS que nomeasse um novo Primeiro-Ministro mas o PS não o quis indicar, preferindo eleições antecipadas. Vamos ver o que acha o PSD.
Ao Dr. Durão Barroso exige-se, caso venha a ser eleito, que aproveite esta oportunidade excepcional e que mantendo a imparcialidade necessária, faça um lugar de construção e afirmação dos países menos favorecidos da EU. Sabemos que os grandes da Europa pretendem que Durão seja um presidente discreto mas nós dele exigimos uma postura pró-activa e de constante empenhamento político, que marque em contraponto, o anterior mandato apagado e despercebido de Romano Prodi. Só assim valerá a pena.
António Granjeia*
*Administrador do Jornal da Bairrada
Diário de Aveiro |