Os níveis de cádmio, cobre, chumbo e zinco, em solos de hortas urbanas e em pastagens situadas na área do Grande Porto, ultrapassam os valores máximos definidos pela União Europeia (UE) para a presença em zonas agrícolas destes metais pesados e potencialmente tóxicos. As conclusões, que são extensíveis às hortas urbanas do restante território nacional, pertencem a uma equipa de investigadores da Universidade de Aveiro (UA) que, não desaconselhando o consumo humano e animal de produtos hortícolas e de pastagens que crescem em áreas urbanas ou industriais, apontam para a necessidade de avaliação da qualidade dos solos e do risco para a saúde pública da ingestão dos produtos em causa. A análise das centenas de amostras de solo recolhidas em hortas situadas nos arredores da cidade do Porto, mais concretamente na Maia, em Leça da Palmeira, em Matosinhos e em São Mamede de Infesta, revelou que as concentrações de metais pesados são comparáveis aos valores observados noutras cidades europeias, nomeadamente em Espanha, no Reino Unido ou na Holanda. Com uma diferença. Ao contrário destes e de outros países da UE, em Portugal não estão fixados limites para elementos potencialmente tóxicos em solos de áreas agrícolas, residenciais e industriais. Muito menos estão definidos no país procedimentos para avaliação de risco para o ambiente e saúde humana nessas áreas e definidos critérios para a remediação de solos contaminados. De facto, apela Sónia Rodrigues, investigadora do Departamento de Química (DQ) e do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) da UA, “é crucial implementar critérios de qualidade de solos que sejam adequados aos tipos de solo mais comuns em Portugal”. A coordenadora do estudo revela que “os níveis de chumbo observados nos solos são superiores àqueles observados em área rurais em Portugal”. E nas plantas, nomeadamente no azevém que serve de pasto a animais que poderão entrar na cadeia alimentar dos portugueses, “obtiveram-se valores de cádmio, cobre e zinco que excederam os critérios de qualidade para forragens animais”. Ainda sem se debruçarem sobre os eventuais problemas para a saúde que a ingestão de produtos plantados à beira das estradas pode acarretar, os investigadores da UA incidiram a sua investigação nos alimentos consumidos por vacas e ovelhas nesses locais ou noutros de características urbanas. No caso das vacas, a ingestão diária excede os limites de cobre em sete locais estudados e os limites de chumbo em oito. Os cientistas do DQ apontam que é preciso avaliar a exposição efectiva de animais aos pastos cultivados nas cidades, assim como os riscos para a saúde humana. Um trabalho que está por fazer no país. “Os consumidores devem ter preocupação em perceber a origem dos produtos vegetais e animais que consomem”, diz Sónia Rodrigues. No caso dos produtos serem oriundos de áreas urbanas ou industriais, alerta a investigadora, “deverá haver interesse em saber se foi efectuada uma análise da qualidade do solo e dos produtos em causa”. De notar que o estudo da UA se focou na análise de elementos inorgânicos potencialmente tóxicos mas, aponta Sónia Rodrigues, “poderão ocorrer também contaminantes orgânicos em solos com origem em actividades industriais ou serem resultado da urbanização”. Neste momento a equipa de investigação tem já a decorrer estudos adicionais para avaliação não só da disponibilidade de elementos potencialmente tóxicos para serem transferidos para as plantas mas também ao nível da sua bioacessibilidade, ou seja da disponibilidade para serem absorvidos no sistema gastro-intestinal humano após a ingestão de solos (especialmente no caso das crianças através do gesto de levarem a mão à boca depois de mexerem na terra) e alimentos contaminados. Diário de Aveiro |