Duas biólogas da UA isolaram um antibiótico capaz de combater duas das mais resistentes e patogénicas bactérias hospitalares: Staphylococcus aureus meticilina resistente (MRSA) e Enterococcus vancomicina resistentes (VRE). Produzido pela bactéria de Gram positivo Bacillus licheniformis, isolada numa fonte termal, o composto foi sintetizado pelas investigadoras da UA, pela primeira vez, in vivo, numa bactéria de Gram negativo, quebrando-se desta forma um dogma de 20 anos.
Em 1941, nascia uma nova era na área da medicina. Howard Florey e Ernst Chain conseguiam produzir, pela primeira vez, à escala industrial, o antibiótico descoberto por Fleming em 1928: a penicilina. Em 2011, Sónia Mendo e Tânia Caetano, duas investigadoras do Departamento de Biologia da UA/Laboratório Associado CESAM, alcançam um novo feito ao conseguir, pela primeira vez, sintetizar totalmente in vivo numa bactéria de Gram negativo o lantibiótico lichenicidina, um composto com propriedades antibióticas.
«Utilizando Escherichia coli (E. coli), uma bactéria de Gram negativo, que é a mais comum e uma das mais antigas bactérias simbiontes do homem, principalmente em ambiente hospitalar, como hospedeiro, obtivemos, por expressão heteróloga, a síntese deste composto. Esta conquista foi de extrema importância porque conseguimos colocar um organismo de Gram negativo a produzir um composto que, de forma natural, não o produziria», explicam as investigadoras.
A estirpe produtora de antibiótico, Bacillus licheniformis I89, foi isolada numa fonte termal, a 65 graus, durante um estudo de procura de estirpes produtoras de novos antimicrobianos. O composto produzido inibia o crescimento de bactérias indicadoras, denunciando propriedades antibióticas. Após vários estudos de caracterização fisiológica e genética da estirpe, bem como da caracterização da substância produzida, as investigadoras perceberam que estavam perante um antibiótico peptídico, mais concretamente um lantibiótico, a lichenicidina.
A investigação desenvolvida parcialmente em parceria com o Instituto de Química da Universidade Técnica de Berlim mostra que o composto original bem como o agora produzido pela bactéria de Gram negativo (E. coli) tem propriedades activas contra estirpes hospitalares como MRSA e VRE, duas bactérias facilmente transmissíveis, principalmente em ambiente hospitalar, e com grande resistência aos medicamentos já existentes.«Existem cada vez mais bactérias resistentes ou multi-resistentes aos diferentes antibióticos. O composto isolado possui algumas características particulares que permitem, por exemplo e através de manipulação genética, produzir novos compostos antibacterianos. Por outro lado, dado o seu mecanismo de acção (dois alvos em simultâneo), o desenvolvimento de resistência por parte das bactérias torna-se mais difícil. Este antibiótico pode ter potencial do ponto de vista biotecnológico, não só pela temperatura a que é produzido, 50 graus, mas também, sendo peptídico, permite fazer manipulações que podem, no futuro, originar novos compostos também com actividade antibacteriana melhorada».
Texto: UADiário de Aveiro |